20190203_Dívida Pública Portuguesa sobe em 2018 para 244,9 mil milhões euros

De acordo com o diário Público de 2 Fevereiro 2019, a dívida pública portuguesa atinge os 244,9 mil milhões de euros.
Imagem1
Esta dívida deve pagar em 2019 juros no valor de 7.418,9 milhões (Público de 16 Outubro 2018).
Segundo o suplemento do Público de 16 Outubro 2018 o Orçamento Geral do Estado para 2019, prevê uma receita total de 90.719 milhões de euros e uma despesa total de 91.104 milhões de euros. Das receitas ressalta 294,8 milhões euros de Imposto sobre o Álcool e as bebidas Alcoólicas (IABA) e 1.347,3 milhões euros de Imposto sobre o Tabaco (IT).


Comentário (20190203mgl): na luta contra o burnout dos profissionais de saúde torna-se óbvio a necessidade de dar melhores condições de trabalho aos médicos e a outros membros da equipa de saúde. A atual greve “cirúrgica” dos enfermeiros é mais um exemplo do descontentamento de todos estes profissionais. No entanto quando olhamos para a realidade fria dos números compreendemos a dificuldade (impossibilidade?) do Serviço Nacional de Saúde (SNS) responder aos legítimos anseios de um numeroso grupo de profissionais. Um eventual caminho será tentarmos, todos (doentes/utentes e profissionais) economizarmos no dia a dia do funcionamento do Sistema. Como? Aqui está a pergunta difícil à espera de uma resposta realista.

Nota: é com tristeza que verifico o valor elevadíssimo do IT e um IABA reduzido a um quinto desse valor. O vinho não é abrangido por esse imposto e todas as bebidas alcoólicas tem um valor de mercado significativamente menor do que aquele praticado em toda a Europa (por exemplo aqui ao lado em Espanha).

20190127_Nos EUA o esgotamento dos médicos (burnout) é uma crise de saúde pública nos cuidados de saúde

Num relatório publicado a 17 Janeiro 2019, com 12 páginas e 27 referências bibliográficas, com o título A Crisis in Health Care: A Call to Action on Physician Burnout da responsabilidade da Massachusetts Medical Society, Massachusetts Health and Hospital Association, Harvard T.H. Chan School of Public Health, and Harvard Global Health Institute, chama-se a atenção para a urgência em levar a sério o esgotamento dos médicos (e outros profissionais de saúde) nos Estados Unidos da América.

O documento inclui diretivas destinadas a reduzir a prevalência de burnout entre médicos e outros prestadores de cuidados, incluindo:
1.     Todas as principais organizações de saúde devem nomear um diretor encarregue do bem-estar dos médicos;
2.     Deve ser fornecido apoio para todos aqueles profissionais que sofram de burnout;
3.     Devemos melhorar a eficiência dos Electronic Health Record (EHR).

Neste último tópico dão sugestões concretas para a criação de um ecossistema de aplicações que permita melhorar a interface médicos/EHR através da criação de uniform public application programming interface (API) for healthcare data (figura 1 na página 7).

Devemos lembrar que a 28 Novembro 2016 a Ordem dos Médicos patrocinou a divulgação do estudo: BURNOUT NA CLASSE MÉDICA. ESTUDO NACIONAL. PRINCIPAIS RESULTADOS. SESSÃO DE APRESENTAÇÃO ORDEM DOS MÉDICOS, LISBOA 28/11/2016
Burnout na Classe Médica. Estudo Nacional. Principais Resultados. Lisboa 28/11/2016. 
A amostra do estudo é uma amostra representativa constituída por 9176 médicos e corresponde a uma taxa de resposta de 29%. Os resultados revelam que 66% dos médicos da amostra apresentam um nível elevado de Exaustão Emocional, 39% um nível elevado de Despersonalização, e 30% um elevado nível de Diminuição da Realização Profissional.

Comentários (20190127mgl) – Comecemos pela definição do problema:
Definição de burnout (esgotamento) do médico segundo o relatório EUA 2019: uma situação em que os médicos perdem a satisfação e um sentido de eficácia no seu trabalho.
Definição no relatório da Ordem dos Médicos de 2016: A Síndrome de Burnout constitui uma reação disfuncional ao stress profissional cumulativo e prolongado. É uma síndrome que envolve exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização profissional.

Quer em Portugal quer nos EUA o problema é real e deve desde já ser encarado à procura de soluções.

O programa da Antena 1 “O Amor é – (Diário)”, com Júlio Machado Vaz e Inês Meneses,  tratou este tema do burnout dos médicos divulgando o documento norte-americano. Em dois episódios (30 e 31 Janeiro 2019) de cerca de 5 minutos cada, abordam o assunto de forma adequada. Os programas podem ser acedidos em:
30 Jan. 2019 – O burnout dos médicos I. (duração: 5m 0’’)
31 Jan. 2019 – O burnout dos médicos II. (duração: 4m 01’’)

Para além de tomarmos conhecimento do tema que fazer?
O Dr. Miguel Guimarães (então Presidente do Conselho Regional do Norte da OM) publicou na Revista da OM de setembro 2016, paginas 62-63, um artigo “Síndrome de Burnout: que fazer para evitar o esgotamento dos médicos?” onde avança com algumas sugestões importantes.
Gostaria de acrescentar mais alguns comentários:
1 – Divulgar o tema e principalmente o documento de Boston (que considero um Guideline vindo de Harvard University em Boston e da sociedade médica que publica o The New England Journal of Medicine) e sensibilizar os decisores (Ordem dos Médicos, Sociedades Cientificas Médicas, Administradores, direções, políticos, etc.) e ainda os doentes e profissionais de saúde que nós – médicos –  temos limites e se eles forem ultrapassados poderemos ser incapazes de funcionar. Em Portugal o nível remuneratório baixo e as exigências profissionais, por vezes exorbitantes, contribuem para este fenómeno. Agravam o problema o excesso de informação produzida e divulgada na área da Medicina Clínica, associada a uma assimetria de conhecimentos existentes entre as várias especialidades e competências médicas.
2 – O documento dá pelo menos 3 conselhos (recomendações – ver acima) que devemos tentar implementar entre nós.
3 – Sou particularmente sensível ao problema do EHR (Electronic Health Record ou Registo Eletrónico do Processo Clínico do Doente). Com a necessidade de executar atos médicos com limites de tempo muito reduzidos (10-15 minutos), a introdução do preenchimento de um número elevado de campos em sistemas informáticos obsoletos, torna a consulta médica num contrarrelógio, que nalguns (muitos) de nós provoca uma sensação de stress doloroso. O documento desenvolve o conceito que temos de ter Apps (ou seja Aplicações quer para sistemas organizacionais quer para os nossos smartphones pessoais) que ajudem a nossa tarefa no novo mundo médico digital.
4 – Fiquei preocupado quando soube, há anos, que mais de 1000 médicos pediram à Ordem dos Médicos (OM) dispensa da utilização das Receitas Desmaterializadas por “incapacidade pessoal atestada por declaração pela honra do requerente”. Na altura pensei que a OM deveria ter organizado ações de formação para dar apoio a cada um de nós, menos novos, para quem as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) não são tão intuitivas como acontece com os profissionais de saúde mais jovens. Ou seja recomendo que se criem programas de Formação-Médica-ao-Longo-da-Vida que ajudem os médicos (e restantes profissionais de saúde) a ultrapassar os obstáculos tecnológicos (e outros) que nos vão surgindo.  Nesta área pode-se incluir programas de atualização mais dirigidos aos médicos não-cardiologistas ou cardiologistas do ambulatório que não lidam com os avanços da Medicina Cardiovascular e que tem um enorme peso assistencial com listas de esperas gigantescas nos Serviços de Cardiologia de referência.

20190124_Aplicar já o ensaio COMPASS?

O estudo COMPASS (patrocinado pelo fabricante de rivaroxaban – Xarelto) de prevenção secundária na doença aterosclerótica estável foi publicado no The New England Journal of Medicine (NEJM) de 5 Outubro 2017 (DOI: 10.1056/NEJMoa1709118).

Este ensaio clínico envolveu 27.395 doentes (dtes) com doença das artérias coronárias (sintomática ou revascularizada), doença arterial periférica sintomática ou ambas. Doentes com doença coronária com menos de 65 anos tinham de ter aterosclerose num segundo leito vascular ou pelo menos dois fatores de alto risco. Os critérios de exclusão incluíram alto risco de hemorragia, comorbidades graves, taxa de filtração glomerular <15 mL / minuto, insuficiência cardíaca grave e necessidade de terapia antiplaquetária dupla (o protocolo disponibilizado tem 415 páginas e há ainda 38 paginas de suplemento em apêndice).

O estudo foi interrompido precocemente ao fim de um seguimento médio de 23 meses pois o objetivo primário (morte cardiovascular, AVC ou enfarto do miocárdio) foi atingido em 379 doentes (dts) do grupo de rivaroxaban (2,5 mg x2/por dia) + Aspirina (100 mg por dia) em comparação com 496 dtes do grupo controlo que fez só 100 mg de aspirina por dia (intervalo de confiança -IC- de 0,66 a 0,86 com p<0,001) mas à custa de maior risco de hemorragia significativa (288 dtes versus 170 dtes, IC: 1,40 a 2,05, p<0,001) sem diferenças no risco de hemorragia intracraniana ou morte por hemorragia. Houve 313 mortes (3,4%) no grupo rivaroxabana-mais-aspirina, em comparação com 378 (4,1%) no grupo aspirina-sozinha (IC= 0,71 a 0,96; P = 0,01).
A outra dose de rivaroxaban testada (5mg x2 sem aspirina) não mostrou benefício quanto ao objetivo primário mas associou-se a maior risco de hemorragia que a aspirina isolada.
Eugene Braunwald escreve em editorial do NEJM (DOI: 10.1056/NEJMe1710241): This trial represents an important step forward in thrombocardiology, and it is likely to change practice guidelines.

Noutro estudo incluíram os 6391 participantes do COMPASS com doença arterial periférica (DAP) dos membros inferiores, em particular aqueles que sofreram um evento adverso importante do membro (major adverse limb event – MALE), definido como isquemia grave do membro levando a uma intervenção ou grande amputação vascular. (Anand SS et al. Major adverse limb events in lower extremity peripheral artery disease: COMPASS trial. J Am Coll Cardiol 2018 Mar 11; [e-pub]. – http://dx.doi.org/10.1016/j.jacc.2018.03.008). Dos 6.391 dtes 128 (2,0%) sofreram um MALE (evento adverso importante do membro) durante um período médio de 21 meses de acompanhamento. Após o MALE os riscos acumulados no ano de seguimento foram 95,4% para um novo internamento, 22,9% para amputações vasculares, 8,7% para morte e 3,8% para um evento adverso major cardiovascular. Comparado com a aspirina sozinha, o rivaroxaban associado à aspirina reduziu a incidência de MALE em 43%, amputações vasculares totais em 58% e intervenções vasculares periféricas em 24% (todas as diferenças estatisticamente significativas).

Segundo John Mandrola, em valores absolutos, o estudo COMPASS reduz em 1,3% o objetivo primário (NNT=76) com um aumento do risco de hemorragia de 1,2%.(Mandrola,J.- The COMPASS Trial: Time for Clear Heads, Not Celebration – Medscape – Aug 31, 2017).
NNT= number needed to treat 

No final de 2018 a FDA aprovou esta associação de rivaroxaban (2,5 mg x2/por dia) + Aspirina (100 mg por dia) na prevenção secundária da doença aterosclerótica estável. Nos EUA a terapêutica do rivaroxaban, nesta dose, custa cerca de USD$500 por mês (Medical Letter Vol. 60 (1561) December 3, 2018). Em Portugal só estão disponíveis comprimidos de 10 mg (75,34 € por 30 comprimidos), de 15 mg (101,60 por 42 comprimidos) e 20 mg (73,27 por 28 comprimidos) na pesquisa de medicamentos na base do SNS realizada em 20190124.

O Medical Letter de dezembro 2018 conclui sobre esta terapêutica:Whether the benefits outweigh the drawbacks of taking two daily doses of an expensive second drug that is more likely to cause bleeding and to interact with other drugs is debatable”

Comentário (20190124mgl): Um colega, que muito respeito, perguntou-me se devia iniciar o esquema recomendado pelo ensaio COMPASS num seu doente que tem doença aterosclerótica difusa e muito agressiva. De acordo com os dados disponíveis teria tendência para o não fazer já que não dispomos, ainda, da dose recomendada (comprimidos de 2,5 mg) e que o benefício terá de ser comparado com os riscos (de hemorragia). Aqui, como noutras situações clínicas, o doente deverá ser integrado numa análise beneficio-risco (como mais uma análise de tipo Heart Team) de forma que a sua opção seja devidamente valorizada.

20161005-A procura da cura da doença cardíaca coronária

Acaba de ser anunciado no Medpage Today a concessão de um subsídio de investigação de 75 milhões de dólares – One Brave Idea – para procurar a “cura da doença coronária”.

Este anúncio decorreu durante a reunião anual da American Heart Association (AHA) e contemplou Calcum NacRae,MD, PhD, diretor do departamento de medicina cardiovascular, Brigham and Women’s Hospital em Boston, EUA. Este investigador e a sua equipa vão procurar os indicadores precoces da doença cardíaca coronária, quer a nível molecular quer a nível genético.

Comentário (20161005mgl) – são ótimas notícias a criação de condições objetivas para fazer avançar o nosso conhecimento sobre as doenças cardiovasculares e em particular a doença cardíaca coronária, desbravando a nova fronteira da ciência biomédica: a genética. Após os 5 anos do prazo do projeto tenho a certeza que muito conhecimento relevante terá sido adquirido. E este conhecimento poderá ter várias aplicações clínicas. No entanto uma palavra de prudência sobre o anúncio da procura da “cura da doença” que Medpage Today utiliza para chamar a atenção dos seus leitores. Quando estive nos EUA (1972-74) vivi o processo que levou o presidente Nixon a conceder um enorme subsídio para se obter a “cura do cancro”. Como foi descrito no New York Times de 23 Abril 2009 o resultado foi negativo e hoje, em 2016, ainda não vemos a hipótese de fazer desaparecer as doenças oncológicas. O mesmo irá acontecer com as doenças cardiovasculares que temos vindo a conseguir atrasar o seu aparecimento no ciclo de vida de cada um de nós. No entanto a “cura” parece muito distante.